A comunidade de Micro-SaaS por trás do movimento
O que é um Micro-SaaS?
Recebo muitas perguntas sobre esse tema. Acredito que o objetivo no final do dia seja esse, não é? Pensar fora da caixa. A grande reflexão do Micro-SaaS é sobre quebrar paradigmas para diferentes tipos de empreendedorismo menos “sexy”.
Segue abaixo a opinião do Eduardo da GetNinjas sobre o modelo de Micro-SaaS, como sendo um modelo pouco atrativo para investidores de risco. O que não está errado.
Na verdade, o modelo de Micro-SaaS é o oposto do que o ecossistema de startups prega hoje. Por quê? Porque ele nasce para ser pequeno, com baixo risco e maior foco em retorno. Mas… será que toda startup nasce micro? e Micro-SaaS pode ser considerado uma startup e entrar para categoria de investimento de risco?
A ideia deste artigo é ajudar a construir mais ideias sobre este mundo.
Micro-Saas: o surgimento do conceito
O pioneiro no tema foi um empreendedor chamado Tyler Tringas. De acordo com ele, Micro-SaaS nada mais é do que uma categoria de softwares que, em sua essência, nasceram para ser pequenos desde sua fundação.
Um produto digital, focado em um mercado de nicho, gerenciado por uma pessoa ou um pequeno time, com baixo custo (enxuto por natureza), ultra foco em resolver uma ou duas coisas muito bem, uma pequena e dedicada base de usuários recorrente e fiéis. Sem foco em investimento ou crescimento rápido.
Resumindo: um produto digital de receita recorrente com baixa manutenção.
Tyler havia fundado uma startup que foi bootstrap (sem aporte de capital de risco) e, com o crescimento dela, acabou recebendo investimento de risco e no final o negócio não deu certo. Tyler comenta que esse aprendizado o atingiu em todos aspectos da sua vida: relacionamentos, saúde, sanidade e conta bancária. E a partir disso, concluiu que não queria mais seguir pelo caminho de Capital de Risco.
Em frente, Tyler decidiu montar montar mais um SaaS, dessa vez sem investidor, enquanto viajava pelo mundo com sua namorada fazendo “freelas” online e amadurecendo seus projetos. Sua ideia inicial era ter uma fonte de renda passiva, enquanto viajava mundo afora. O que ele mais gosta de fazer é sentar e desenvolver software no seu tempo livre, sem a necessidade de ficar preso em uma rotina baseada em trabalho-homem-hora.
Assim surgiu a StoreMapper e o conceito de Micro-SaaS, que no primeiro ano lhe rendeu mais de $260 mil reais de faturamento sem funcionários ou grandes desafios. Alguns anos depois, vendeu seu projeto por 6 dígitos.
Você pode ver mais da história dele aqui
Ta curtindo o conteúdo? Se inscreva e ajude a comunidade a crescer por R$ 5 reais.
Quem é a comunidade por trás deste movimento?
Intitulados de Indie Hackers, essa comunidade é extremamente ativa dentro de quatro principais plataformas:
- Product Hunt.
- Twitter (principal).
- IndieHackers website.
- Alguns grupos de nicho de Discord.
Um dos movimentos que mais admiro dessa comunidade é o #BuildInPublic. Não vou aprofundar muito o que significa e como surgiu, mas de forma resumida significa construir uma empresa de forma pública, transparente, compartilhando toda jornada de aprendizados e métricas para toda a comunidade. Inclusive, essa newsletter é construída nessa filosofia. Isso gera:
- Construção da marca e criação de “fãs” que acompanham a montanha russa de montar um negócio.
- Construção de uma comunidade em torno de um produto, uma marca, uma pessoa. “Top of mind”.
- Feedbacks e retenção dos usuários.
- Maior facilidade de testar novas funcionalidades com “early-users”.
- Menos suporte – a própria comunidade ajuda nas dúvidas e respostas.
- Mais faturamento em outros Micro-SaaS e produtos como newsletters, cursos, etc.
Exemplo de profissional que vem fazendo com sucesso #BuildInPublic.
Para eles, um Micro-SaaS tem 3 objetivos:
- Resolver um problema muito específico, para um grupo específico.
- Você poder trabalhar de qualquer lugar do mundo.
- “Ramem profitability”: A meta é gerar uma renda adicional e chegar até o ponto de pagar o salário do fundador. Chegando nesse momento, se prova que seu MicroSaaS tem pernas e que vale a pena investir nele.
E o que a comunidade Micro-SaaS diz sobre montar um?
Seguem algumas dicas que encontrei e achei interessantes dentro da comunidade. Dedicarei um artigo mais para frente para esse tópico.
Seja 5x melhor do que os clientes já usam ou pagam
Você precisa ser 5x mais barato ou 5x melhor do que as soluções que existem por aí. Se você montar um Micro-SaaS “nice to have” que uma planilha de Excel resolveria o problema no lugar dele, então provavelmente não é um bom começo.
No caso de Tyler, na época, para os comerciantes terem um localizador de loja a única alternativa era pagar US$1.000 para um desenvolvedor fazer do zero. O storemapper custava US$5 por mês.
Mais concorrentes, melhor.
No mundo do Micro-SaaS você não está buscando seguir a metodologia de “Zero to One” para criar algo completamente novo e enorme. A ideia é que se há concorrência é um ótimo sinal (é claro, que se existirem milhares de produtos semelhantes no mercado, possivelmente não seja uma boa ideia). Mas se você não conseguir achar um produto ou serviço que resolva o problema, é um sinal que talvez o mercado não seja muito bom ou que seja muito caro começar um do zero (educar o cliente é caro e demorado).
Um bom mercado, na minha opinião, seria um mercado que já possua concorrentes e que as funcionalidades sejam tão abrangentes que acabem deixando muita gente insatisfeita. Existem oportunidades de separar essa funcionalidade e criar uma empresa em cima dela. Em suma: nichos dentro de grandes empresas de SaaS.
Além disso, oportunidades dentro de marketplace de grandes empresas, como Shoppify, Salesforce, Omie store, Slack store, Intercom app store, etc.
Tenha um canal para achar os primeiros 10 aos 1000 clientes.
Uma vez que você achar um problema para resolver que precise de um produto, você precisa urgentemente validar essa “dor” buscando pelo menos 25 clientes usuários do seu MVP. Achar um canal e ter bem claro quem é seu usuário (persona) é crucial.
Por isso, a recomendação que se tenha um nicho para se focar no primeiro momento. Sendo específico, além de entender melhor a dor que resolve, permite que você teste canais de aquisição de clientes (orgânicos e pagos) com mais foco e clareza nos testes.
Neste exemplo abaixo, na construção do ConvertKit de Nathan Barry, quando ele decidiu em que nicho iria focar, optou por entrar em contato com possíveis clientes via e-mail para entender o que eles menos gostavam nos principais players do mercado e, a partir daí, montar sua comunicação e crescer seu canal. E aí, entrevista a entrevista, lentamente, sua receita foi crescendo de US$1.5k para US$15k mês.
Validação do ConvertKit da sua proposta de valor para sua persona.
Conceito de MVP (Produto mínimo viável) vs MLP (Produto mínimo amável)
O conceito de Lean Startup é lei no ecossistema de construção de MVP’s. Mas para o mundo do Micro-SaaS em 2022, não é o suficiente. Estamos falando de algo simples e em um mercado que possivelmente já exista concorrentes. Então, tem-se a necessidade de um produto MLP.
Um produto mínimo amável significa um produto com uma boa UX (design vs experiência). De forma resumida: faça um MVP quando você não tem certeza sobre o que os clientes querem. Seja rápido e faça testes rápidos. Faça um MLP quando você estiver resolvendo um problema que as pessoas já entendem e quando já tiver claramente definido o mercado e a dor e estiver buscando se destacar dos concorrentes.
“Say you’re trying to test whether people like pizza. If you serve them burnt pizza, you’re not getting feedback on whether they like pizza. You only know that they don’t like burnt pizza. Similarly, when you’re only relying on the MVP, the fastest and cheapest functional prototype, you risk not actually testing your product, but rather a poor or flawed version of it.”
Founder Market Fit
Por fim, Chris Dixon chama de Founder/Market Fit um empreendedor que monta uma empresa a partir de tarefas que goste de fazer. Ou seja, não deve ser considerado construir um MicroSaaS em um mercado que você não conhece ou não “gosta”. Não faz sentido doar anos de sua vida em resolver um problema que você não goste.
E qual a diferença de um SaaS?
Meu amigo André Pires, um empreendedor que admiro muito, me fez uma provocação. O que é Micro-SaaS e qual a diferença dele para um pequeno SaaS?
E a verdade é que não existe uma diferença clara. Pelo menos não para mim. Quando me pego pensando, qualquer pessoa pode intitular seu SaaS como micro. Mas no fundo, acho que o conceito da palavra MicroSaaS está muito mais atrelado ao que o empreendedor busca e não ao produto por si próprio.
Um exercício para tentar entender as principais diferenças:
- Nasce para ser pequeno por natureza.
- Mercado de nicho (cauda longa total) – tamanho de mercado é irrelevante.
- Custos enxutos. Margem alta.
- Menos crescimento, mais retenção. “Do things that don’t scale” literalmente.
- Foco em dividendos.
- Mais uso de um Centro de Serviço compartilhado (“freelas”). Menos contratação de pessoas.
Por fim, deixo uma reflexão sobre o tema.
O ecossistema de startups hoje é muito embasado no mundo do Capital de Risco, do “valuation” alto, dos super-escritórios-farialima, dos projetos inovadores de alto impacto e dos empreendedores mais fodas do mercado.
Este ano completo 1 década dentro deste ecossistema e, sinceramente, eu acho que ele é maravilhoso e funciona super bem. Mas, francamente, esse jogo não é para todos. É um jogo de longo prazo e de muito suor. E principalmente, um jogo difícil de equilibrar os pratinhos entre vida pessoal e profissional. Mente aquele que diz que faz isso com sucesso. Ainda estou para conhecer um empreendedor de alto impacto que faz ou faz.
Para mim, Micro-SaaS é uma alternativa para o pessoal early-stage. Um movimento que deve se fortificar (espero) e que traga alternativas para esses empreendedores. Uma alternativa que não seja só pegar rodada atrás de rodada, mas que sim, é possível montar um pequeno e rentável negócio, e que com o tempo naturalmente ele vai crescer. E um dia, você vai poder tomar uma decisão se deseja ir pelo caminho do Capital de Risco com muito mais maturidade ou se deseja manter a empresa para si gerando receita e talvez construir mais projetos em torno dela.
Empreender é uma arte e não um estilo de vida.
Uma reflexão de um empreendedor para outro.
“Portfolio of small bets”, Daniel Vassaz